112. Beijo Entrelaçado , entre nós, dividido por dois, porque ninguém beija sozinho a não ser no reino distante da sua própria imaginação, onde tudo pode acontecer, mas sem a força viva e sentida da realidade. Um ato somado por ambos num só enlaço que se deseja unânime no empenho, inequívoco nas intenções, aprimorado no encadeamento da pele, das bocas, dos olhares e dos sentimentos. Beijo entrelaçado, qual cruzada, na luta pelo bem maior ao qual o verbo amar não é alheio, numa partilha de algo entre dois seres que se entregam mutuamente, trocando entre eles o comando das comutações, confundindo lábios, línguas e sons, gostos e aromas. Uma trança erótica de semblantes lascivos que se enleiam em concupiscências cúmplices que advêm, de um singular adrego de frenesim conjunto, do sorrir das almas para jubilo dos corações.
VI
"EU ESPERO"
Penso sozinho, eu sei,
Na solidão...
E o silêncio, nas sombras,
Não me ajuda...
Apenas faz crescer
Minha paixão...
Apenas me corrói
E me tortura
Em processos de mágoas
E loucura!...
E como se agrava a minha dor...
Em mil momentos de pavor...
Pois quanto mais eu penso,
Mais eu sei,
O quanto me dói
E me magoa,
Ter na solidão a voz amiga
Ou um riso cínico de intriga!...
Onde estará o meu amor?
Será que me deseja
Ou que me insulta?
E pensará em mim
A flor oculta?
Porque será que amar
Também é dor...?
Talvez se sinta só,
Para além das estrelas,
Através de imaginária ponte...
Através da linha do horizonte
Vem com as ondas do mar,
Vem para amar...
Espuma de raiva incontida
De querer e me não ter,
Mas de ser vida...
Mas de ser Ser...
Ela sabe, ao certo,
Que a desejo...
Me conhece bem
Em cada beijo...
Ai! Como posso eu
Viver sem ela...?
Eu quero o meu amor aqui,
Comigo...
Brilhando com o brilho
De uma estrela!...
Sinto algures alguém...
Sinto um respirar na escuridão...
E sinto mesmo
Sem sentir ninguém
Porque oiço bater um coração,
No silêncio dos limbos
Que não vejo,
No escuro vagabundo
Onde desejo,
Qual Haragano,
Um Etéreo ser,
Sem forma definida...
Eu a verei até,
Talvez, quem sabe,
Um outro Inverno...
E esperarei de pé,
Mesmo que a força acabe,
Na calote cristalina, glaciar,
No frio gelado de tão externo...
Se tiver de aguardar...
Aguardarei...
Aguardarei por meu amor eterno!...
Como um raio de Sol ela será...
Tão radiante
O gelo fundirá...
Nada esconderá o seu semblante!...
Viajar pela noite viajarei...
Guiando-me pela luz sem ter sinais...
A luz do seu amor, do meu amor,
A luz dos nossos ideais!...
E agora, por fim, nada mais digo...
Sei... sou... desejo... quero...
Eu sei meu amor o que consigo:
"-Amor acredita... Amor... eu espero!..."
Haragano, O Etéreo in Nos Caminhos da Flor
(Gil Saraiva)
IV
"ETERNA ROCHA"
A flor do jardim olhou para mim...
Eu, um Vagabundo Dos Limbos,
Da net; Senhor da Bruma, da noite;
Haragano, O Etéreo...
Lenda urbana de quem nunca
Ninguém ouviu falar...
Passava perto, a caminho da vida,
E a flor do jardim olhou para mim...
As pétalas penteadas pela brisa,
O tronco hirto e firme pela certeza,
As folhas como braços abertos
Em minha direção...
"- É contigo que eu quero partilhar
A minha essência...
Aqui, numa cama de pétalas,
Sob um céu de luar...
Vem! Terás contigo o perfume da noite,
O sorriso das estrelas,
A plácida tranquilidade da Serra
Perante a eterna vigília da Lua...
Vem! Ocupa o meu jardim, sê meu Senhor,
O Senhor da Serra da Lua,
Dono do meu amar, do meu amor..."
Olhei a flor do jardim...
Ainda suspirava na ansia da resposta...
Olhei a flor, ali, ao sol exposta,
Branca e pura como a pura neve,
Silvestre e livre como a liberdade,
Doce e bela como a natureza...
Sorri... Oh como eu sorri...
Sorri de orgulho daquele olhar florido
Em mim poisado,
De vaidade infinita por me sentir
O desejo profundo de uma flor
E respondi:
"- Flor, eu sou um Vagabundo Dos Limbos,
Da net; Senhor da Bruma, da noite;
Haragano, O Etéreo,
Lenda urbana de quem nunca
Ninguém ouviu falar,
Buscava perdido o caminho da vida,
Em confusão, e... afinal...
Tudo é tão mais simples...
Serei teu e serás minha
Se o orvalho da madrugada
Eu poder ser em tua sede,
Alimentando-te a raiz e o existir...
Serei, enfim, o solo onde te firmas,
Servo da terra onde és jardim...
Não te quero eu perder,
Dá-me o teu etéreo existir
Na eternidade,
Transmuta-me na Serra da Lua...
Que a minha voz seja agora
A do vento que sopra de Ocidente,
A saliva o mar
Que desagua no meu corpo
E meus passos as pegadas do futuro
Que um qualquer dinossauro
Marcou na eterna rocha..."
Haragano, O Etéreo in Nos Caminhos da Flor
(Gil Saraiva)
XII
"QUEM..."
Quem
Tem na esperança
O sussurrar cálido das marés?
Quem
Encontra no próprio reflexo a alegria
De vivo se sentir com confiança?
Quem
Procura sempre o impossível
Sem temer ou mesmo desistir...?
Quem
Sente o nascer do Sol
No crepúsculo insustentável da madrugada?
Quem
Reconhece ser seu o Vagabundo
Perdido nos Limbos pela busca?
Quem
Vê o Haragano na bruma
E lhe reconhece os traços do Éter?
Um só alguém!...
E esse quem
Não tem o que temer,
Por que tremer,
Pois brilha mais alto,
Mais forte e mais além...!
E luta, como luta mais ninguém,
Mesmo na mais temível escuridão,
Acabando por encontrar, por conquistar,
E por sorrir, enfim, ao ver no espelho
A imagem refletora de um futuro
Que em cada segundo se torna presente...!
Que em cada “impresente” renasce em saudade!...
Assim...
Todos saberão conhecer o tal de quem,
Que no sussurrar ameno das marés,
Completará um próximo devir,
Com a forma simples de um sorrir...
Mas será realmente que esse quem,
Com a “imatemática” clareza dos sentidos,
Sente, o amor, sem incerteza?
Mesmo sem temer ou desistir?
Talvez...
Quantos ou quantas acharão sinais
E por engano se julgarão escolhidos?
Só quem acreditar que jamais
A ilógica absurda, de um tão grande amor,
Poderia servir de engodo vil
Ganhará a glória terminal!
E esse alguém terá...
No sussurrar cálido das marés,
Na alegria de vivo se sentir,
Na procura impossível sem temer,
No crepúsculo insustentável da madrugada,
No brilho mais alto, mais forte, mais além,
Na busca perdida pelos Limbos,
E na mais temível escuridão,
A taça da vitória conquistada,
A certeza de saber que o quem
É ele ou ela e mais ninguém!
Para mim,
Apenas importa esse meu quem!
E espero meu amor, querida, meu bem,
Que a taça seja eu e ela tua,
Tal como o infinito é mais além,
Tal como da Terra satélite é a Lua...
E só assim,
Por fim,
Na forma de um sorriso, feito belo,
O meu quem se refletirá da cara nua,
Por provir simples, franco, singelo,
Desse amado rosto, dessa face tua!
Haragano, O Etéreo in Achas para um Vagabundo
(Gil Saraiva)
III
"AMAR"
Amar, amar e só amar alguém;
Amar, por toda a vida, eternamente;
Amar, quem só nos ama, loucamente,
Amar, como Florbela... usar também
Por mote um de seus versos, que diz bem:
"Eu quero amar, amar, perdidamente,"
No futuro, passado, no presente,
Amar como eu nunca amei ninguém...
Amar quem nesse amor se adora e ama,
Em chamas de alegria e de calor,
Amar, por quem meu corpo arde, chama;
Chama que arde e dura por amor...
Amar, amar, amar, essa ternura,
Essa mulher que sonho ser loucura...
Haragano, O Etéreo in Terra De Vénus
(Gil Saraiva)
"SELVAGEM"
Passas rebelde, sem olhar ninguém,
Sorris de vida, procuras amor,
Tens a garra e a força do Condor
E duras as palavras para quem
Tenta deter-te a ti, sem vir por bem...
Tens no brilho do olhar um fogo, ardor,
Felino de vontades e fulgor,
Ansioso de ser feliz também...
Amas de coração, sem ser problema,
E não pareces ser essa ternura,
Que ocultas lá no fundo, em forma pura,
Soberana de vida, um diadema!...
Rainha és, num trono de coragem,
Mulher entre as mulheres... mais:... Selvagem!
Haragano, O Etéreo in Livro de Um Amor
(Gil Saraiva)