Registos da Memória - VIII - Branca Noiva do Mar - O Salva-vidas
(Fuzeta, Branca Noiva do Mar – O Salva-vidas - VIII - Foto de autor, direitos reservados)
Registos da Memória
VIII
Branca Noiva do Mar – O Salva-vidas
Não é fácil arranjar um ícone mais perfeito para a Branca Noiva do Mar, essa Fuzeta nas margens da Ria Formosa, do que o salva-vidas velhinho, que no seu lugar se impõe majestoso na paisagem, como que a querer-nos recordar tempos idos de glória, ao serviço do Instituto de Socorros a Náufragos, quando a barra da ilha era quase à sua frente. Um antigamente sempre lembrado por essa presença firme no acompanhamento das marés, sob o comando da Lua, esteja a ria em espelho ou agitada.
Desta vez foi pintado de um amarelo vivo, torrado, quase laranja, dirão alguns. Porém, já foi azul e branco, e outras vezes houve em que apenas o reboco se avistava, até caindo, aqui e ali, deixado ao abandono por causa de uma presença que há muito tempo perdeu todo o sentido. Todavia, pela estima que lhe dá a população, pela quantidade inaudita de fotografias que lhe são tiradas, a pressão mediática tem obrigado as autoridades a um restauro, avulso, mas importante da soberba fachada, das laterais e até dos fundos do idoso, mas imponente edifício, que tenta a todo o custo preservar a dignidade nobre da sua presença evidente na ria, quase na margem da Branca Noiva do Mar que sempre o estimou.
Nesse remoto existir, no antigamente ativo salva-vidas, os barcos de socorro desciam pela sua grandiosa rampa, pintados de branco e vermelho, lembrando que estavam ao serviço da gente do mar, no socorro daqueles contra quem o Atlântico se tivesse revoltado sem motivo. Sim, sim! Porque o salva-vidas existia para salvar vidas de pescadores, de marinheiros, daqueles que do mar tiravam o sustento. Muitas vezes pensei que o desativado, mas nobre, salva-vidas devia ter direito a uma nova vida, quiçá como restaurante ou marisqueira, talvez discoteca ou núcleo desportivo. Mas isto pensei eu e mais de metade dos filhos da Branca Noiva do Mar, que adoram aquelas paredes erguidas em plena Ria Formosa. Contudo, resistindo sempre, nunca o Instituto de Socorros a Náufragos o quis vender ou ceder à exploração. Acho que em segredo, aguarda que o Atlântico abra de novo a barra ali em frente, para que o salva-vidas ser reerga paladino.
Gil Saraiva