X
"NÉCTAR"
O Néctar dos Deuses,
Um tal de hidromel,
Pode ser divino,
Digno de tão elevados seres,
Mas não tem o sabor do nosso amor...
Não sabe a vida e a eternidade,
Não tem a plenitude num mero segundo,
Não nos faz sentir que existimos
Porque precisamos de viver
Para poder tocar o infinito
No espaço estrito
De um simples olhar...
O Néctar dos Deuses
Pode ser divino,
Pode ser perfeito,
Pode ser puro,
Pode ser cristalino,
Pode ser indescritível,
Mas não é absoluto
Como nós...
Somos um ser total
Em construção,
Estamos para além
Dos sentidos
E dos sentimentos,
Somos o futuro,
A esperança e a alegria
Das nossas próprias almas...
O Néctar dos Deuses
Pode ser divino,
Mas não tem a graça
Do teu sorriso,
O perfume do teu ser,
A alma desse corpo
Onde me perco de mim,
Para despertar num tal de nós...
Se és a flor oculta
Deste meu existir,
Até aqui perdido,
Eu mais nada quero ser
Do que a terra
Onde cada uma das tuas raízes
E todas elas
Se alimentam até à eternidade...
Até à eternidade
Numa sede sem fim
E que por convenção
Chamamos de amor!...
Eu te amo!
O Néctar dos Deuses
Afinal não é importante...
Haragano, O Etéreo in Nos Caminhos da Flor
(Gil Saraiva)
IX
"NÃO LEIAS..."
Não leias...
Não leias estes versos
Meu amor,
Eles, que são pra ti,
Não deves ler
Pois não podes, jamais,
Pensar saber
Que meros versos são...
Uns sem valor...
Não leias estes versos...
Por favor...
Neles, faminto vivo
Por viver,
Neles, razão tu és
Deste meu ser,
Neles, eu nada sou
Sem teu calor...
.
Não leias estes versos
Que te escrevo,
Não pode o teu amor
Calhar-me à sorte,
Não tenho as quarto folhas
Num só trevo
Se na roda da vida
Tenho a morte...
Não leias estes versos
Sonho terno
Se eu em teu existir
Não for eterno...
Não leias estes versos
Que falam de um de nós
Que apenas minha mente
E minha voz
Inventaram de forma inconsistente...
Não leias estes versos...
Estou doente!...
Como podes tu ler
Esta passagem
Se mais real que tu
É uma miragem!...
Haragano, O Etéreo in Nos Caminhos Da Flor
(Gil Saraiva)
VII
"FRAGRÂNCIA"
Na fragrância vaporina
De um odor...
Vindo do branco têxtil
De uma renda...
Te sinto eu:
...
No íntimo do teu cheiro...
Do teu ser...
Do teu corpo...
Do teu eu!!!
Sentir-te é sentir-me!...
E eu...
Sou tão egoísta
Dessa palavra simples
Chamada: Nós!
Quero-te!...
Na plenitude do uno
E do indivisível
Para poder viver em ti...
Na fragrância
Vaporina
De um amor...
Haragano, O Etéreo in Nos Caminhos Da Flor
(Gil Saraiva)
XIII
"SEXTO SENTIDO"
Se eu fosse um mouro,
Em seu castelo erguido
Na Serra que da Lua
Tem o nome e o sentir,
Gritando, lá do alto,
Sortilégios esotéricos
Ao povo Luso que a Serra invade,
Com sede de terra e de poder,
Para esse espaço a sangue,
Ferro e fogo conquistar...
Se eu fosse um nigromante,
Feiticeiro da Serra da Lua,
Qual mago que um tambor
Rufando enche de glória,
Senhor de Áfricas
Sem fim ou sem princípio,
Soberano dos vivos
E dos mortos evocados,
Dono da negra magia do Passado,
Podendo, com meus dons,
Fazer parar as leis da guerra,
Que os continentes
De todo enfeitiçaram...
Se eu fosse o vento
Que mais forte sopra,
No altivo castelo da mourama,
Na noite tempestiva de invernos
Perdidos entre lareiras
Que as memórias não consomem,
Por mais alto
Que arda a chama,
Por mais calor
Que a lenha produza...
Imperador de tufões,
De vendavais,
Rei do sopro
Que não se esgota nunca,
Por muito que me venha zumbir
Dentro da alma,
Sussurrando-me aos ouvidos
Desesperos de infinito,
Que parecem competir
Com a velha eternidade...
Se eu fosse a dança,
Que dança e não balança,
Em sete véus mágicos de moura,
Em movimentos de ondulante ritmo,
Marcado em cada passo,
Em que a forma acompanha o som,
Como se a perfeição
Estética da vida
Pudesse traduzir a festa
Da evidente humanidade
Ou a música da alegria da vitória,
Um grito mudo de gozo e de prazer,
Que ao Homem faz viver
E reviver no espaço e tempo,
Qual passo de baile
A celebrar eventos mil
Mais do que outros já havidos...
Se eu fosse a bela Primavera,
Terna de ambientes,
Florida nos caminhos,
Altiva no serrado,
Nesse Castelo dos Mouros
Amada a cada volta,
A cada curva,
Destemida e sem receio
De um dia perder a liberdade...
Enfim, uma estação solidária,
Realizada de viva esperança,
Cega de perfumes e odores
Em cada berro de vida
Que me cerca e me transborda...
Se eu fosse, por fim,
A Fortaleza Árabe,
Em Sintra altiva e imponente,
Ou simples mato,
Uma terra de medos,
Mistérios e surpresas,
Fonte de vida,
Abrigo de animais,
Floresta tropical,
Savana, bosque,
Ou ainda até,
E porque não,
Selva africana
Ou charneca em flor...
Se eu fosse tudo isto
E muito mais,
Diria,
Como direi agora,
A mesma coisa simples
E pequena:
"- Guarda só pra ti
Os meus segredos,
Meu amor,
E vive para que eu possa viver,
Pleno de ti,
Que sem ti nada é poder!...
Espera-me nesta vida
E na outra se a houver,
Com os teus braços abertos
Por carinhos,
Enfeitada de sedas e perfumes,
Cetins, veludos
E linhos de encantar
Ou nua apenas,
Qual odalisca que sem esforço
Conquista o temível sultão...
Mas mais que tudo
Ama o vagabundo dos limbos,
Ama Haragano, O Etéreo,
Este eu, cujo discurso
Se perde nas palavras,
Mas que este coração a ti doou,
Porque tu és
O meu sexto sentido!"
Haragano, O Etéreo in Achas para um Vagabundo
(Gil Saraiva)
X
"INFINITO"
Um astro brilha lá no firmamento;
Um ponto que me aponta o infinito;
Um cometa indicando um velho mito,
Formado há muito já no pensamento
Por não caber no nosso entendimento,
Como não coube no do antigo Egito,
E, nem nessa Índia velha do sânscrito
Ou mesmo até no Novo Testamento...
Tantos sonhos pra lá da estratosfera;
Lendas de deuses, Deus, de Lúcifer;
Materialismos, carne... só mister!
Ah! Pobres humanos quem vos dera
Poder, como eu, viver qualquer quimera,
No infinito amor desta mulher!
Haragano, O Etéreo in Terra de Vénus
(Gil Saraiva)
IX
"FLOR DA PELE"
Sentir à flor da pele o verbo amar,
Amar de corpo e alma, com furor...
Sentir, vibrar, viver e pressupor
Que o ser humano tem num só olhar:
A força e a vontade de lutar,
A garra e o poder de sobrepor
A tudo e todos a palavra amor,
Por mais que essa palavra vá custar!...
Sentir, à flor da pele toda uma vida
No prazer divinal de um só orgasmo...
Viver de gosto em pleno entusiasmo,
Amar sem fronteiras, foragida...
Assim sempre tu és e apaixonada
Amas-me à flor da pele... da pele suada!...
Haragano, O Etéreo in Terra de Vénus
(Gil Saraiva)
IV
"É APENAS AMOR"
É apenas amor, mas se isso é tudo
Como posso viver tão longe agora?
Como sorrir à dor que me devora
Se o espelho cada vez é mais sisudo?
Como posso viver se esta demora
Me afasta de teu ventre de veludo?
É apenas amor o grito mudo
Que dentro do meu peito, em fogo, chora!...
É apenas amor, por ti, amor...
Meu olhar turvo, a voz meio abafada,
A mão dormente, o corpo sem calor,
O vazio da mente enevoada...
Tem apenas amor meu Universo
E já nem forças tenho pra outro verso!...
Haragano, O Etéreo in Terra de Vénus
(Gil Saraiva)
"SE"
Ai!... Se este viver nosso, em nossa vida,
Tem real importância, na verdade;
Se amor se vive, em nós, em lealdade;
Se não te dás, tu mesmo, por vencida;
Se não pensas em breve despedida;
Se choras por, apenas, felicidade;
Se nunca foi, nem é, só caridade
O motivo que a mim te tem unida;
Se, para ti, Amor, o amor é arte;
Se, para ti, sou só eu a escultura
Que um certo artista, um dia, retalhou
Espero ser, e vir da tua parte,
A vida, o ter, o amor e a ternura,
Que de mim para sempre se apossou...
Haragano, O Etéreo in Livro de Um Amor
(Gil Saraiva)
"ARDE"
Arde por teus cabelos o meu ser,
No fogo que deles vem me perco eu...
Arde comigo o sonho sem Morfeu
Nos braços me ter feito adormecer...
Arde, tão lentamente, o meu viver,
Parece durar mais que um jubileu...
Arde deste desejo de ser teu,
De esperança, de loucura, de te ter...
Arde na noite já a terminar,
Luz, que a distância não separa, é...!
Coração, vida, riso, alma, maré,
Ardem juntos num simples relembrar...
Arde no fogo tudo... é divinal...
Arde por ti a aurora boreal!...
Haragano, O Etéreo in Livro de Um Amor
(Gil Saraiva)